15/04/2025

Preságio - Fernando Pessoa





O AMOR, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
P'ra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...


Fernando Pessoa




12/04/2025

Chove - Poema de José Gomes Ferreira





Chove...

Mas isso que importa!,
se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir a chuva que cai do céu
uma melodia de silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?

Chove...

Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama.


José Gomes Ferreira


08/04/2025

Dança, bailarina, dança…





Dança, bailarina, dança… Dança, bailarina, dança…
Põe nos teus passos toda a harmonia
E toda a poesia nas pontas de teus pés
Em gestos nobres, faze surgir a fé!!!

Gira, bailarina, gira…
Vai girando e semeando amor,
Mais depressa que as voltas do mundo,
Pra que haja tempo de matar a dor!

Baila, bailarina, baila…
Traz contigo a primavera
Pra florir os campos, florescendo a Terra,
Numa explosão de cores que tua dança encerra.

Faze de tua arte uma suave prece
Capaz de enternecer os corações de pedra
Faze tua música soar tão alto
Calando assim os estopins da guerra!!!

Mostra ao Homem que o teu bailado
Expressa a vida nesse simples ato…
Onde o amor é tudo, onde o amor é nato.

Que em teus saltos ponhas tua garra
Seguindo sempre a luz de teu clarão,
Quebrando muros para unir os povos
Num universo único, onde se deem as mãos.

Abre tua alma, no esplendor da dança…
Não desistas nunca e verás, enfim,
Bailar no campo, doce e cálida esperança,
Em meio às flores de um lindo jardim…


Carmen Lucia Carvalho de Souza



05/04/2025

Fanatismo - Florbela Espanca






Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida.
Meus olhos andam cegos de te ver.
Não és sequer razão do meu viver
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No mist'rioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!...

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa...
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah! podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: princípio e fim!..."


Florbela Espanca, in "Livro de Sóror Saudade"




29/03/2025

Beija-flores - Poema de Alberto de Oliveira





Os beija-flores, em festa,
Com o sol, com a luz, com os rumores,
Saem da verde floresta,
Como um punhado de flores.

E abrindo as asas formosas,
As asas aurifulgentes,
Feitas de opalas ardentes
Com coloridos de rosas,

Os beija-flores, em bando,
Boêmios enfeitiçados,
Vão como beijos voando
Por sobre os virentes prados;

Sobem às altas colinas,
Descem aos vales formosos,
E espraiam-se após ruidosos
Pela extensão das campinas.

Depois, sussurrando a flux
Dos cactos ensanguentados,
Bailam nos prismas da luz,
De solto pólen dourados.

Ah! como a orquídea estremece
Ao ver que um deles, mais vivo,
Até seu gérmen lascivo
Mergulha, interna-se, desce...

E não haver uma rosa
De tantas, uma açucena,
Uma violeta piedosa,
Que quando a morte sem pena

Um destes seres fulmina,
Abra-se em férvido enleio,
Como a alma de uma menina,
Para guardá-lo no seio!


Alberto de Oliveira
Publicado no livro Meridionais 




23/03/2025

Buscas - Anna Carlini




Gosto de pessoas de alma franca
Sorriso de criança
coração sintonia branca
Um olhar clemente
atos de bondade
um gesto de compaixão
uma vida de compreensão
busca de elevação.

Amo,
quem procura apaziguar
aquele que busca saber
o que aprecia ajudar
a Luz da simplicidade
recheada de caridade.


Anna Carlini



19/03/2025

Semana Comemorativa do Dia Mundial da Poesia




Participando com muito prazer no convite da amiga Rosélia do Blogue "Escritos d'Alma".

Divagando com a Imagem dada




Junto ao Mar ao entardecer


Junto ao mar num belo entardecer,
o vento embala um amor a nascer.
Numa dança louca com ondas de paixão,
o teu toque incendia o meu coração.

Tuas mãos em mim, torna o mundo perfeito,
tua voz sussurrando, ecoa no meu peito.
Nos teus braços a paixão, é pura poesia,
acendendo uma chama, em versos de magia.

As ondas alegres, num intenso bailado,
Acompanham o amor, que é declarado.
Profundo, intenso, reflete-se no olhar
e o tempo pára, só para nos guardar.

Ficamos juntos, com o mar a embalar,
um abraço sentido, uma só alma a amar.
E o dia partiu, mas deixou nascer
o amor em nós, num belo entardecer.




15/03/2025

Rotina - Bernardina Vilar




A vida é sempre a mesma. Uma rotina.
Há flores despontando, outras morrendo
Há pássaros cantando entre a campina
E há ninho vazio adormecendo.

De luar, há brancura em luz divina,
E noite escura em trevas se envolvendo;
Rio cantarolando. Frio, neblina,
E terra ardendo em brasa se estorcendo.

Há sorrisos, cantares, dor e pranto
Mal divididos. A uns fica a lembrança...
Outros vivem feliz realidade.

Assim decorre a vida. E por encanto
Em cada amanhecer há uma esperança
E em cada pôr-do-sol uma saudade.


Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)



09/03/2025

Melancolia - Maria de Santa Isabel





Porque trouxeste as horas já vividas
Para, neste momento, recordar?
Porque notaste as lágrimas caídas,
Que jamais tornaremos a chorar?

A vida não tem páginas relidas,
Tudo nela é constante renovar,
E nós somos as folhas ressequidas
Dum poema que o Outono vai rasgar...

Folhas mortas, que ficam sossegadas,
Deixai-as para sempre nas estradas...
Para que levantá-las, Ventania?

Antes de morrer na paz do esquecimento,
Do que ser arrastada pelo vento,
Em hora de cruel melancolia...


Maria de Santa Isabel
(Maria Palmira Osório de Castro Sande Meneses e Vasconcellos Alcaide)
In Flor de Esteva



05/03/2025

Vida, Vida - Delores Pires





A vida
Está
na pétala
colorida,
da flor,
no sorriso
ingênuo
das crianças
que brincam,
correm,
pulam,
nos passantes
que andam
lá fora,
no homem
que trabalha
arduamente
para
o sustento
do lar,
no rosto
cansado
das pessoas
que carregam
o peso
do sofrimento,
e,
sobretudo,
no AMOR!


Delores Pires
In: A Estrela e a Busca




27/02/2025

Sonhos ao crepúsculo - Dreams in the dusk





Sonhos ao crepúsculo,
Apenas sonhos fechando o dia
E, com o fim do dia, voltar
Para as coisas cinzentas, para as coisas escuras,
As coisas distantes e profundas da terra dos sonhos.

Sonhos, apenas sonhos ao crepúsculo,
Apenas as antigas imagens lembradas
De tempos passados quando o final do dia
Escrevia em lágrimas as perdas do coração.

Lágrimas e perdas e sonhos desfeitos
Talvez encontrem o teu coração ao anoitecer


Carl Sandburg
(Tradução livre)




Poema original

DREAMS IN THE DUSK

Dreams in the dusk,
Only dreams closing the day
And with the day's close going back
To the gray things, to the dark things,
The far, deep things of dreamland.

Dreams, only dreams in the dusk,
Only the old remembered pictures
Of lost days when the day's loss
Wrote in tears the heart's loss.

Tears and loss and broken dreams
May find your heart at dusk.


Carl Sandburg



23/02/2025

Solitude - Delores Pires





Silente, à tardinha,
desliza ao sabor da brisa
gaivota sozinha.


Delores Pires
"O Livro dos Haicais"



17/02/2025

Depois de Tudo - Cassiano Ricardo





Mas tudo passou tão depressa
Não consigo dormir agora.

Nunca o silêncio gritou tanto
Nas ruas da minha memória.

Como agarrar líquido o tempo
Que pelos vãos dos dedos flui?

Meu coração é hoje um pássaro
Pousado na árvore que eu fui.


Cassiano Ricardo




11/02/2025

Participação na 4ª Celebração de S. Valentim do BLOG do JUVENAL NUNES





O Dia dos Namorados, celebrado a 14 de fevereiro, é uma data especial dedicada ao amor. Tem como padroeiro São Valentim, que com coragem teria desafiado a proibição de Roma, celebrado casamentos secretos, defendendo o amor e a união entre casais, o que transformou, num símbolo de romance e paixão.




Aceitando com muito prazer, o convite do Juvenal Nunes do Blogue “Palavras Aladas”, para festejar esta data, deixo a minha participação na 4ª Celebração de S. Valentim, com o tema : "A Seta do Cupido".


No céu de São Valentim,
O Cupido voa sem parar,
Com a sua flecha de amor,
Dois corações quer ligar.

A seta do cupido, com pontaria,
dispara certeira aos corações,
unindo almas gemeas por magia,
numa dança de doces paixões.

No Dia dos Namorados,
Celebramos o amor,
Em todas as suas formas,
Com alegria e fervor.

O amor é chama acesa,
brisa leve a perfumar,
tem mistério e tem beleza,
tem mil formas de encantar.


Um Dia de São Valentim muito Feliz para TODOS



09/02/2025

Daquilo que se acabou - - Walter Dimenstein





“Quem não sabe o que é saudade
Faça do jeito que eu fiz
Vá para um lugar bem longe
Sem querer como eu não quis
Fique distante de todos
E depois você me diz”

(Do folclore nordestino)

Porém há outra saudade
Porque assim alguém o quis
Displicência ou maldade
Que torna o ser infeliz
Deixando a vida vazia
Com a noite igual ao dia
Mas é bom guardar na vida
O pouquinho que sobrou
Pois saudade é tudo que fica
Daquilo que se acabou.


Walter Dimenstein
Médico e poeta pernambucano




06/02/2025

Poema Razões de Bernardina Vilar





Desde o princípio em que foi feito o mundo
Uma sentença existe, e que não muda:
Persiste o arraigado mais profundo
Que o amor é cego e que a saudade é muda.

Passam-se os tempos e evolui a vida.
Há inovações e toda lei se estuda;
Ninguém remove a instigação antiga
Que o amor é cego e que a saudade é muda.

...Talvez se ame a quem não deva amarmos...
E neste item com rigor me apego,
Vendo a razão por que o amor é cego.

E se sofrermos por silenciarmos
Do abandono a dor sobeja e aguda,
Eis a razão por que a saudade é muda.


Bernardina Vilar
em 'Meus Versos'





02/02/2025

Primavera e Vida - Delores Pires





Manhã alegre,
canto de cigarra,
sol colorido,
natureza em flor.
É primavera nas nuvens brancas,
no azul festivo.
Borboleta
perpassa o ar
perfumado.
Pousa
na árvore
revestida
de brotos verdes.
É primavera
lá fora,
no pássaro que voa
beijando a flor,
no inseto que zumbe,
nas folhas clorofiladas,
nas pessoas...
É primavera.
Alegria.
Vida...


Delores Pires
In A Estrela e a Busca




29/01/2025

Falavam-me de Amor - Natália Correia





Quando um ramo de doze badaladas
se espalhava nos móveis e tu vinhas
solstício de mel pelas escadas
de um sentimento com nozes e com pinhas,

menino eras de lenha e crepitavas
porque do fogo o nome antigo tinhas
e em sua eternidade colocavas
o que a infância pedia às andorinhas.

Depois nas folhas secas te envolvias
de trezentos e muitos lerdos dias
e eras um sol na sombra flagelado.

O fel que por nós bebes te liberta
e no manso natal que te conserta
só tu ficaste a ti acostumado.


Natália Correia, in 'O Dilúvio e a Pomba'



26/01/2025

Poema Hoje - Anna Carlini





Hoje com o coração partido,
Saio mais cedo em busca de abrigo.
Abrigo que jamais encontrarei...

Saio em busca da distração
Que me faz esquecer
As mágoas de meus dias,
A impossível solução.

Preocupação, insatisfação
O choro amargo da ausência.

O passado vai longe,
A saudade ficou comigo.
Vamos embora de mãos dadas.


Anna Carlini





19/01/2025

Elegia da Noite




A noite cheia de astros encantados,
Cinza do sol caindo sobre o mar ...
A noite, a noite negra, olhos fechados
De Deus que adormeceu para sonhar.

Noite estendendo as asas pela altura,
Águia negra pairando em todo o além,
Véu de noiva que abriu em sepultura,
Berço do sol e seu caixão também.

Fogueira estranha enchendo o firmamento,
Em negras labaredas tumultua,
Como se a densa treva num momento
Tornasse negra a própria luz da lua.

A noite, a noite triste e tenebrosa,
Eco de luz, sombra talvez de um grito ...
E lembra assim, tão negra e misteriosa,
A minha alma errando no Infinito ...


Anrique Paço D’Arcos
in Poesias Completas




15/01/2025

Crepúsculo - Anrique Paço D’Arcos




Paisagem do meu sonho .. Que tristeza
Alonga para os céus os pinheirais!
Crescem na tarde sombras e incertezas,
Sobe da terra o fumo dos casais.

É a hora dolorida em que se reza,
Em que as almas e as cousas são iguais,
No longo adeus do sol à natureza,
Cheia de luto e misterioso ais.

Paisagem do meu sonho em que me abismo,
Olhos turvos de lágrimas, e cismo
Na dor de quanto vai perdido à sorte ...

É a hora dolorida da ansiedade,
Em que a vida se abraça à Eternidade
E o meu sentir se casa com a morte!


Anrique Paço D’Arcos
in Poesias Completas



12/01/2025

Florir – é um Fim – casualmente





Florir – é um Fim – casualmente
Vendo uma Flor no campo
Talvez sequer alguém perceba
A sutil Circunstância

Que há na Lúcida Tarefa
A tal custo cumprida
Para se abrir qual Borboleta
Ao Sol do meio-dia –

Encher Botão – evitar Bicho –
O Orvalho obter bem cedo –
Expor-se à Luz – fugir ao Vento –
Precaver-se da Abelha

E não frustrar a Natureza
Que nesse Dia a aguarda –
Ser uma Flor é uma profunda
Responsabilidade –


Emily Dickinson
Alguns poemas - Tradução de José Lira





08/01/2025

Dom - Haikai de Helena Kolody





Deus dá a todos uma estrela.
Uns fazem da estrela um sol.
Outros nem conseguem vê-la


Helena Kolody




05/01/2025

Prece - Bernardina Vilar





De Deus eu quero a luz que me ilumine,
Do ser humano um pouco de bondade;
Do mal que fiz, perdão que me redime
E da ilusão a grata realidade.

Do coração eu quero o amor que imprime
N’alma o fulgor da justa caridade;
Do sofrimento a lágrima que exprime
O bálsamo da dor, da acerbidade.

Da inocência a pureza que irradia,
Do pássaro cantor, da voz o encanto
E das campinas o odor inigualável.

Dos felizes, um pouco de alegria...
Dos que sofrem o alívio de seu pranto;
Da humildade e da paz o gosto afável.


Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)



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